A dura realidade dos alunos pode gerar um choque cultural tão grande que, às vezes, dificulta a construção de uma relação de confiança entre professor-aluno, prejudicando ainda mais o ensino e a criação de movimentos em prol da aprendizagem dos estudantes.
Começamos a identificar histórias bem-sucedidas. Casos de professores que conseguiam individualmente criar uma ponte de relacionamento com os alunos a partir da integração de elementos de sua história de vida nas práticas pedagógicas. Chamamos esses movimentos de dispositivos de resgate a partir do repertório pessoal de cada educador. Esses professores têm histórias de vida que os fazem atuar na história de vida do aluno promovendo resgates destes sujeitos, colocando-os novamente na linha do aprendizado a partir de habilidades de relacionamento.
A força das histórias de vida e das experiências pessoais são elementos determinantes das práticas dos professores. O saber o que se quer, quem se é e qual seu lugar no mundo é transportado para a docência.
Experiências educacionais positivas ou negativas podem mudar a relação com a educação. A influência de professores-referência é capaz de acionar o desejo de se tornar professor, seja por aspiração, gratidão ou reparação.
Os professores trazem em suas falas uma convicção muito forte de que muito mais do que conhecimentos técnicos, o que conta na relação professor-aluno, nas relações de aprendizagem, é justamente o aspecto relacional, tangibilizados nas relações afetivas.
O ambiente é elemento chave na experiência educacional, seja como elemento catalisador de relações, seja como elemento que falta para produzir movimentos mais positivos na escola.
A falta de espírito coletivo e do senso de coletividade faz com as relações de grupo sejam frágeis. A maior parte dos professores não se sentem e não se dizem parte de um projeto maior de escola. Existem conflitos entre professores e no modo como enxergam a profissão.
Tanto do ponto de vista da sociedade quanto do ponto de vista do próprio professor, a escola pública é envolta por um conjunto de simbolismos e preconceitos ressaltados pelos especialistas entrevistados e presentes nas falas de diversos professores.
Diego tem 34 anos é formado em geografia, é professor desde os 23 anos. Desde o início da carreira, sempre apostou na construção de relacionamentos com os alunos como estratégia para aprendizagem. Trabalhava com horta, fazia oficinas de rádio, realizava trabalhos de campo com os alunos para reconhecimento dos territórios onde se localizava a escola onde trabalhava. Acredita que a academia lhe deu instrumentos de pesquisa e conhecimentos, mas o aprendizado para a construção de relações que consigam resgatar os alunos para os processos de aprendizagem e para o envolvimento com o ambiente escolar vem das suas experiências com a Capoeira.
Professores como Givanilson são professores alfabetizadores e passam muito tempo perto das crianças e entendem que um professor pode ser divertido e ensinar se divertindo, melhorando o comportamento dos alunos entendendo os tópicos das conversas deles e aproveitando esse conteúdo como gancho para tratar assuntos do curriculum. Sabem que muitos dos seus alunos vivem em contextos desafiadores e tentam engaja-los para que possam pensar que por meio da educação podem ser os donos do seu próprio destino. Pela sua curiosidade e entrega com a música, se consolidou no facebook como influencer. Professores como Givanilson geralmente se conectam com professores em outros municípios e em outros estados.
Professores como Sandro entenderam que para combater o analfabetismo científico, a prática era sua melhor companhia. Ele consegue entender que as aulas de física não são números apenas, mas sim uma ciência com uma arte por trás que cada aluno merece entender. Para ele, as perguntas são o veículo para se chegar ao conhecimento. Sem perguntas a criança curiosa que está dentro de todos nós morre. Professores como Sandro entendem que o ENEM é uma obrigação, mas acordam com os alunos como amenizar esse percurso.
A jornada do professor passa pelo entendimento do contexto em que sua comunidade escolar está inserida e quem são aqueles estudantes que estão sentados à sua frente, ou seja, suas histórias de vida, suas emoções, suas potencias e seus limites. As faculdades de formação inicial ainda não cumprem o papel de preparar o docente para essa prática: temos as vezes teóricos que chegam na sala de aula sem saber lidar com o que vai além da disciplina que dominam, em descompasso com o que o mundo pede. É preciso criar uma conexão com o aluno para que a didática acompanhe seu ritmo. É preciso reforçar as didáticas e a prática na formação inicial.
A Educação precisa de uma mudança que só se produz coletivamente, mas essa transformação começa primeiro em cada um, a partir do autoconhecimento e do autodesenvolvimento. Acreditamos que o professor deva ser esse ponto de partida e de conexão com o todo. O ser humano é complexo, feito de múltiplas dimensões que merecem ser igualmente nutridas, e seu crescimento pleno está muito além do saber intelectual, e sim nas dimensões das emoções, mente, corpo e propósito.
Desenvolvendo estes aspectos, o Instituto Península acredita que os educadores poderão entender melhor suas fortalezas e oportunidades, aprendendo a lidar com desafios individuais. Isso gera movimento, emancipa, influencia seu trabalho em sala de aula e ajuda a melhorar a prática para garantir o aprendizado.
A falta de confiança entre os colegas professores é uma das doenças escolares mais estratégicas a serem resolvidas. O ambiente organizacional das escolas precisa de atenção.
A pesquisa também identificou que a união dos educadores e o apoio do sistema e da sociedade podem transformar a Educação. Um exemplo é o grupo de docentes em Pernambuco. A partir de uma comunidade escolar fortalecida, que promove uma virada conceitual em torno do paradigma escolar e da forma como os professores percebem seu trabalho, fizeram com que a escola deixasse de ser ‘transmissora’ para se tornar ‘produtora’ de conhecimento, aliando o conteúdo à realidade dos alunos e fazendo uma escola junto com eles.